As revoluções inglesas do
início do século XVII vieram representar um marco significante na vida europeia
e na história da sociedade ocidental, uma vez que, pela primeira vez na
história, a burguesia, aliada à pequena nobreza, assumiu o poder e lançou as
bases necessárias para uma nova ordem, que se caracterizou pela hegemonia do
parlamento.
Esse
processo revolucionário que se desenrolou na Inglaterra tem suas raízes nas
mudanças socioeconômicas que vinham ocorrendo anteriormente. Durante a dinastia
Tudor (1485 – 1603), a política mercantilista de monarcas poderosos, como
Elizabeth I, ajudou o país a se transformar em uma grande potência econômica.
Na época, ela liderava o ramo da indústria têxtil e o da produção de carvão,
sendo, inclusive, uma das maiores potências marítimas. No início do século
XVII, os comerciantes, industriais e armadores constituíam uma burguesia
próspera e atuante.
AS MUDANÇAS DA SOCIEDADE INGLESA
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Gentry |
O
capitalismo não se restringia às cidades inglesas; chegava também ao campo,
onde a gentry (pequena nobreza rural)
enriquecia a grande salto ao praticar a agricultura comercial. Todavia, mesmo
sendo do campo, a gentry buscava se ligar à burguesia das cidades, tanto por
meio de negócios, quanto por meio de casamentos.
Outro
grupo que vinha enriquecendo consideravelmente eram os yeomen (pequenos e médios proprietários rurais). Tanto os yeomen e
os gentry produziam e vendiam lã e alimentos que eram exportados pela marinha
mercante inglesa.
Para
continuar produzindo, alimentos e ovelhas (para a indústria têxtil), eles
começaram a ampliar seus domínios, todavia para isso acontecer houve a expulsão
do campo de camponeses e pequenos proprietários na prática que ficou conhecida
como
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Yeomen |
cercamento.
Em
meio a realidade do cercamento, aqueles que eram expulsos de suas terras
tornavam-se andarilhos, mendigos, ocorrendo também o êxodo rural, onde muitos
iam para as cidades e transformando-se em mão de obra barata e altamente explorada.
Outros iniciaram também um processo de imigração para a colônia inglesa na América, as 13 colônias.
Com
isso, nas cidades inglesas haviam dois mundos, um da rica burguesia mercantil e
manufatureira e outro formado por uma massa de trabalhadores urbanos e de
desempregados. A maior parte da burguesia inglesa era favorável à liberdade de
produção, assim como de comércio, considerando, assim, a política monopolista e
regulamentadora da monarquia inglesa, como prejudicial aos seus negócios.
O ACIRRAMENTO DAS TENSÕES
No
início do século XVII, a Inglaterra vivia a ascensão do nacionalismo, que se
identificava com a causa protestante. Em 1588, o governo da rainha Elizabeth I,
a Inglaterra conseguiu vencer a Armada Espanhola. O aumento da frota para
enfrentar o poder marítimo espanhol, assim como outras políticas adotadas pela
rainha para atender aos interesses da burguesia mercantil inglesa, acabaram
desequilibrando as finanças do reino. Para resolver essa situação, o governo
pediu empréstimos ao Parlamento e recorreu a outras medidas, como a venda de
bens da coroa e concessão e venda de monopólios comerciais e industriais. Essas
medidas acabaram impedindo o poder monárquico de seguir o exemplo e outros
reinos europeus, que criaram fontes permanentes ou novas alternativas de
recursos.
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Rainha Elizabeth I
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A
morte de Elizabeth I, em 1603, criou um grave problema sucessório, pois a
rainha não deixou herdeiros diretos. O trono passou então para seu primo, Jaime
Stuart, eu já era rei da Escócia. O sucessor da rainha não recebeu dos ingleses
muito apoio político e social, isso ocorreu, dentre outras coisas, pelo fato
dele ser defensor da teoria dos direitos divinos do rei.
A
relação entre o monarca e seus súditos piorou em 1610, quando o rei tentou
fugir ao controle financeiro do Parlamento e impôs medidas como o monopólio
real sobre as indústrias de tecido. Valendo lembrar também que nesse período
houve grandes movimentos migratórios em direção a colônia na América, onde
muitos partiam para escapar da tirania da Coroa.
Com
a morte de Jaime I em 1625, assume seu filho Carlos Stuart, todavia ele foi
obrigado a assinar a Petição de Direitos,
que buscava diminuir o poder do monarca, através da proibição do rei de
convocar o exército ou de adotar medidas econômicas sem a aprovação do
parlamento. Mas o tiro saiu pela culatra e o novo rei acabou fazendo as mesmas
coisas que seu pai, agindo de forma autoritária, sobretudo nas esferas
econômicas e religiosa (Buscou impor o anglicanismo aos escoceses, que eram em
sua maioria presbiterianos).
Em
1634 o rei traz de volta uma antiga lei, um imposto que era específico de
cidades portuárias, o ship Money,
aliás, Carlos I não só trouxe de volta como expandiu para todas as cidades,
ampliando o descontentamento.
A
insatisfação popular com tudo que vinha ocorrendo gerou uma crise política. O rei
se viu pressionado, por uma situação fruto dele mesmo, a convocar o Parlamento,
a Assembleia permaneceu funcionando entre os anos de 1640 e 1653, no que ficou
conhecido como o longo Parlamento.
Os
representantes do povo passaram a defender reformas e a fazer oposição às
iniciativas reais. A crise chegou ao ponto de ruptura quando eles exigiram o
cumprimento da lei que proibia o rei de dissolver o Parlamento, além da
convocação de reuniões pela Assembleia pelo menos uma vez a cada três anos. Em resposta
a tudo isso o rei mandou fechar o Parlamento e prender seus principais líderes.
Isso tudo levou a precipitação de uma longa guerra civil, que durou de 1642 a
1651, onde de um lado estava o rei Carlos I, apoiado pelos lordes e pela dissidência
da pequena nobreza. Do outro lado, a Câmara dos Comuns.
PURITANOS VERSUS CAVALEIROS
O
Parlamento Inglês era formado por duas câmaras:
Câmara dos Lordes e a
Câmara
dos Comuns. A Câmara dos Lordes era formada pelos
Lordes Espirituais (a alta cúpula da igreja Anglicana) e pelos
Lordes Temporais (Nobres pertencentes a
alta aristocracia que herdavam o lugar na Assembleia).
A
Câmara dos Comuns era composta de grandes burgueses e pelos gentlemen, ou seja, pertencentes à gentry. Os parlamentares representavam o
conjunto da população, embora fossem formados apenas pelas pessoas de posses.
As
diferenças de classe, de origem social expressavam também as diferenças
religiosas e políticas. Os lordes eram anglicanos, enquanto os comuns eram em
geral presbiterianos (alta burguesia e a gentry) e puritanos (pequenos e médios
burgueses, os yeomen, camponeses, artesãos, etc.). Eles deram ao parlamento uma
arma poderosa, o Exército de novo tipo.
Um
traço interessante desse exército de novo tipo residia na liberdade de organização
e discussão, o que fez desse grupamento armado uma sementeira de ideias políticas.
Nessas
discussões, manifestavam-se grupos mais radicais que os puritanos, a exemplo dos
Diggers e dos
Levellers, que associavam diretamente a reforma religiosa e a luta
política à revolução social.
DIGGERS
= opunham-se a propriedade privada do
solo e exigiam que as terras da Coroa, os terrenos comunais e ociosos fossem
dados aos pobres.
LEVELLERS
= Defendiam a população do campo e exigiam completa liberdade religiosa e a
igualdade de todos perante a lei.
Eram
esses, basicamente, os atores envolvidos no confronto entre o rei e o
Parlamento de depois, um segundo momento da Revolução Inglesa, no conflito
instaurado entre a Assembleia e os grupos de soldados puritanos unidos em torno
de Oliver Cromwell.
DO REI AO LORDE PROTETOR
Em
meio à guerra civil, os presbiterianos assumiram a hegemonia do Parlamento,
enquanto o exército mais radicalizado e comandado por Oliver Cromwell, vencia
as batalhas e conquistava o país para os Comuns. Em 1646 estava terminada a
primeira e mais importante fase do conflito, com a derrota de Carlos I.
Entretanto, os presbiterianos, a ala mais moderada do Parlamento, tentaram
estabelecer um acordo com a realeza, uma vez que não viam com bons olhos a maré
de democracia popular defendida sobretudo pelo Exército de Novo Tipo. Isso
acabou provando a radicalização do processo político.
Em
1647, quando a maioria presbiteriana tentava desmobilizar o exército, o rei foi
preso pelos soldados. Meses depois Carlos I fugiu para a ilha de Wight. Embora a
ilha estive sob controle parlamentar, a fuga agravou a crise. Os realistas
recobraram o ânimo, mobilizaram-se e iniciava, assim, uma nova fase da guerra
civil, todavia, foram derrotados por Cromwell e outros chefes militares.
A
hegemonia na Câmara dos Comuns passou para as mãos dos puritanos, que excluíram
os parlamentares moderados dispostos a negociar com o rei; em 1649, o rei foi
decapitado por traição e se proclamou a República ou Commonwealth. A partir daí um Conselho de Estado governaria
respondendo ao Parlamento, agora unicameral. Oliver Cromwell, presidente do
Conselho de Estado, dividia-se entre as ações administrativas e militares. Em 1649
– 1650 uma rebelião de católicos e realistas explodiu, assim como em 1651
tropas escocesas que apoiavam o filho do rei decapitado iniciaram um levante,
todavia ambas foram sufocadas pelo exército de Novo Tipo, terminando assim a
guerra civil.
Na
esfera político-administrativa o governo extinguiu as taxações e expediu o
primeiro
Ato de Navegação, beneficiando
os setores mercantis e da construção naval.
Mas
os problemas se acumularam. A destruição causada pela guerra civil foi seguida
por desastrosas colheitas, alto custo de vida, baixos salários e pesadas
taxações. Embora Cromwell distribuísse terras na Irlanda aos veteranos como
pagamento de soldos atrasados, a Inglaterra vivia uma situação política e
econômica explosiva.
A
oposição não vinha apenas dos presbiterianos moderados e dos realistas. Os levellers
e os Diggers sentiram-se enganados pelo governo republicano eu, segundo eles,
não haviam implementado medidas de conteúdo democrático que tirassem a maioria
da população da situação em que se encontravam.
Todas
essas manifestações de oposição foram aniquiladas pelo governo de Cromwell.
Em
1653, diante da oposição dos conservadores e dos grupos radicais, Cromwell
dissolveu o Parlamento, assumindo, no mesmo ano, o título de Lorde Protetor da Inglaterra, Escócia e
Irlanda. Entretanto, sua morte, em 1658, representou o golpe de misericórdia
para a República, seu filho, Richard Cromwell, que não tinha a mesma influência
do pai, foi deposto no ano seguinte.
A
história da República Puritana terminou com a tomada do poder pelos nobres
realistas aliados à dissidência presbiteriana, e com a proclamação de Carlos
II, filho do rei decapitado, como soberano da Inglaterra e da Escócia. Iniciou-se
o período conhecido como Restauração
Monárquica.
REVOLUÇÃO GLORIOSA
Carlos
II foi coroado graças à aristocracia e à alta burguesia. Em seu governo, o
comércio e a indústria cresceram com rapidez e a ciência foi estimulada a
partir do livre pensamento, da experimentação e de uma reforma educacional. Todavia,
os atritos com o Parlamento continuaram a existir.
A
Restauração seguiu seu curso com a ascensão de Jaime II, irmão de Carlos II,
que morreu sem herdeiros diretos. O novo rei, que era católico, logo se tornou
impopular. Quando tentou isentar os católicos do pagamento de algumas taxas
impostas a eles por motivos religiosos e indicou alguns líderes para cargos
importantes do governo, foi afastado por um Golpe de Estado conhecido como Revolução Gloriosa (1688).
Mas como
ocorreu essa Revolução?
Com o
nascimento de Jaime Eduardo, filho e herdeiro de Jaime II, o Parlamento resolveu agir contra o rei,
pois o novo filho se tornaria herdeiro do rei absolutista, perpetuando não
apenas a dinastia de Jaime II, mas também a força da religião católica na
Inglaterra. Os parlamentares
se uniram à Maria Stuart, filha do rei, e seu marido, Guilherme
de Orange, para se mobilizarem contra Jaime II. Essa aproximação se deu por
conta da religião, ambos eram calvinistas.
Guilherme de
Orange, em 1688, conseguiu convocar suas tropas, que prontamente cercaram Jaime
II. Sem apoio político e muito menos militar, o rei inglês fugiu para a França,
permanecendo lá até a sua morte. Destronado o rei absolutista, Guilherme de Orange e Maria Stuart foram
coroados rei e rainha da Inglaterra. Porém, antes da coroação,
os dois prestaram juramento ao Parlamento de que nunca se tornariam reis
absolutistas, assinando assim o Toleration Act e o Bill of Right.
Qual a importância da Revolução Gloriosa?
A primeira grande
importância da Revolução Gloriosa para a história da Inglaterra é que ela marca
definitivamente a queda do
absolutismo nesse país. Com isso, a Inglaterra confirmou-se
como uma monarquia
constitucional
baseada nos princípios
liberais, que
foram fundamentais para o acontecimento de outras revoluções no século
seguinte.
A monarquia
constitucional parlamentarista da Inglaterra ficou ratificada por meio do Bill of Rights (Declaração dos
Direitos), documento que Guilherme de Orange e Maria Stuart tiveram que assinar
antes de serem coroados rei e rainha da Inglaterra. Esse documento decretava,
por exemplo, que:
- os
impostos só poderiam ser aumentados mediante aprovação do Parlamento;
- os
reis estavam proibidos de expropriar propriedades privadas e não poderiam
coibir a liberdade de expressão.
As determinações da Bill of Rights seguiam os interesses
da burguesia inglesa,
interessada na implantação dos valores liberais como forma de combater as
doutrinas e os privilégios oriundos do absolutismo que impediam seu
desenvolvimento econômico. A implantação de uma monarquia constitucional
baseada nos princípios liberais foi fundamental para a Inglaterra, pois a nova
política econômica que foi instalada permitiu que o país fosse pioneiro da Revolução
Industrial no século seguinte.
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